O filme “Tesouro Nacional” (“Kokuho”) tornou-se um verdadeiro marco no cinema japonês, ultrapassando a impressionante marca de 11 bilhões de ienes em bilheteria e conquistando o posto de segundo filme live-action de maior arrecadação da história do país. Desde sua estreia, a produção foi aclamada pela crítica e pelo público, não apenas pelas atuações viscerais de seu elenco estelar, mas também pela beleza estonteante de suas locações, que se tornaram pontos de peregrinação para os fãs.
A trama, que mergulha no universo do kabuki, explorando temas como talento, linhagem, amor e ódio, cativou milhões de espectadores. O sucesso estrondoso do filme está impulsionando um renovado interesse do público pelas artes clássicas e pelos locais históricos do Japão.
Santuário Imamiya: O palco de um pacto sombrio
Um dos locais que mais captura a essência dramática de “Tesouro Nacional” é o Santuário Imamiya, em Kyoto. É neste cenário histórico que se desenrola uma das cenas mais impactantes do filme: a cerimônia em que o protagonista Kikuo assume o prestigioso nome de Hanjiro Hanai III.
A cena simboliza o ápice da dedicação de Kikuo à sua arte, um momento de tamanha entrega que se assemelha a um “pacto com o diabo”, inspirado no “Fausto” de Goethe. Ao escolher a arte em detrimento de sua família, a determinação fria do personagem chocou e fascinou o público.
O Santuário Imamiya, localizado no bairro de Murasakino, ao norte de Kyoto, próximo ao famoso Pavilhão Dourado (Kinkaku-ji), tem suas origens no Período Heian. É um local venerado, conhecido por conceder longevidade, saúde e proteção contra desastres. Curiosamente, também é chamado de “Santuário do Casamento Afortunado”. Para os visitantes que desejam reviver a atmosfera do filme, a bela alameda de pedras que Kikuo atravessa em um riquixá é um ponto imperdível. Ao longo do caminho, duas lojas tradicionais, “Kazariya” e “Ichiwa”, servem o famoso aburimochi, um bolinho de arroz grelhado, há séculos. Uma parada para saborear essa iguaria é quase obrigatória para quem visita o local.
A coreografia de “Sonezaki Shinju”: A alma da tradição na tela
O sucesso do filme também lança luz sobre os mestres que trabalharam nos bastidores para garantir a autenticidade da obra. Yoshiyuki Katsumi, de 50 anos, mestre da escola de dança japonesa Katsumi-ryu e presidente da Associação de Música e Dança Tradicional Japonesa de Takasaki, foi o responsável pela coreografia de “Sonezaki Shinju” (“Os Amantes Suicidas de Sonezaki”), uma peça de enorme importância na trama.
“A repercussão foi muito maior do que eu esperava. Fico feliz que o filme tenha despertado o interesse de tantas pessoas pelas artes cênicas clássicas”, comentou Katsumi.
“Sonezaki Shinju” é uma das mais famosas obras do dramaturgo Chikamatsu Monzaemon, escrita em 1703 e baseada em um suicídio duplo real. A peça causou tanto impacto na época que gerou uma onda de suicídios, levando o governo a proibi-la. Em 1953, foi revivida como uma peça de kabuki, alcançando enorme sucesso. A tradição desta obra é mantida pela família de Nakamura Ganjiro, que também atuou como supervisor de kabuki no filme, garantindo a fidelidade e a profundidade da representação desta “peça difícil” e fundamental para a narrativa de “Tesouro Nacional”.